sábado, 3 de novembro de 2012

Sobre olhos azuis e poemas

Lugar comum: um mineiro que busca o mar....
Além das montanhas ele imagina... mas o que  imagina ele?
O que imaginava eu?
Criança,  aproximava -me sorrateiro de minha tia de olhos azuis.
Ela, que morava no Rio de Janeiro em frente  à praia do Leblon, prolongava um pedacinho do mar por dentro dos olhos. Qual outra razão para seus olhos azuis, a não ser o parentesco misterioso com o  mar? Enxergava para além das minhas montanhas e ladeiras de cada dia e a prova disso eram as esmeraldas cravadas justo no nascedouro dos horizontes... orgãos do ver e do imaginar outras paragens, bem incrustados no corpo. Minha tia tinha o misterioso privilégio de possuir suas próprias veredas.
Mais tarde me disseram que ela estudara Freud e que por isso podia dizer aos outros muitas verdades, sem vergonha, medo ou culpa. Não seria por causa do mar? Minha tia ia à Europa! Não iria ela pelo mar, ou pelo ar, o que em termos de cores e de olhos dá no mesmo?
O tempo passou... passamos.
Minha tia "fechou Freud e abriu Drummond" e agora faz poesia.
Já desconfiava que poemas, marolas, tormentas, odes e ondas, domingos de sol e ressacas faziam parte de um mesmo complexo poema. Quando li seus versos pela primeira vez, fiquei certo disso.
Também eu li Freud e me deito resignado em seu divã uma vez por semana a espera de ouvir verdades. Também leio constantemente os poetas,  arrisco - me em suas tormentas  e me deito na areia de seus domingos de sol.
Mas principalmente, continuo criança fascinada por olhos azuis. Quantas promessas de além mar revelam em mim, quando me encaram de frente!