sábado, 8 de dezembro de 2012

Eu, Oswaldo: Pierrot le Fou




Godard me chegou por Caetano Veloso lá pelo final dos anos 80. Lia um estudo sobre a vida e obra do compositor tropicalista no qual havia a descrição da polêmica entre ele e Roberto Carlos devido à proibição do filme Je vous salue, Marie.
En ce temps lá, eu e um amigo, Oswaldo Palhares, começávamos a nos tornar cinéfilos sem o saber. Frequentávamos o único cinema de arte de Belo Horizonte, sala Humberto Mauro, nos perdíamos deliciosamente  nas quebras de narrativas, nos filmes herméticos, nos clássicos e caminhávamos por horas a fio, falando deles, de nós, da vida.
Foi numa tarde, depois de estudarmos nos bancos da Praça da Liberdade que , passando pela locadora, encontrei o polêmico filme.
Sem titubear loquei- o e junto a meu amigo, comecei a assisti- lo. Nunca havíamos visto nada parecido. Era como se algo absolutamente importante se aprensentasse para nós, mas ao mesmo tempo insistisse em nos escapar. Sabíamos que havia algo alí. Oswaldo adormeceu antes que pudesse ver Marrie passando seu baton vermelho na última cena do filme. Oswaldo  voltou a Godard muitas e muitas vezes depois, realizando seu mestrado em cima do autor e se tornando um expert em teoria do cinema.
Mas o que será que me faz amar profundamente  Godard? O que me faz voltar obssessivamente a esse velho anarquista chato que ninguém quer ouvir? O mais estranho é que quanto mais herméticos são seus filmes, mais tenho a compulsão de assisti- los mais e mais.....
Essa semana comprei a maioria de seus filmes numa banca de filmes piratas na rua Augusta. Estou assistindo a todos em ordem cronológica e com muito prazer  revejo outros duas três vezes. . A impressão é cada vez mais forte.
Escrevo imediatamente depois de rever Pierrot le fou.O impacto em mim é como o que senti ao ler Irmãos Karamazov pela primeira vez, ou assistir ao Ham - Let na reabertura do Teatro Oficina. É como se a Liberdade se tornasse evidente enquanto construção. Aventura! Como se forma e conteúdo se mostrassem em sua indissociabilidade na invenção infinita da vida.
Godard desafia a todo momento. Faz Ana Karina e Belmondo falarem comigo desavergonhadamente, tira meu carro da estrada fazendo- o mergulhar no Mediterrâneo, debocha dos marinheiros americanos e rouba deles dinheiro que usam na continuação da aventura de ser livre, citam Rimbaud, Lorca numa praia deserta.
É comum dizer que Godard é um gênio do cinema cujas tantas invenções são melhor aproveitadas por outros cineastas que as roubam e aplicam melhor..... Pode ser. Mas o que me fascina sempre é esse impulso desavergonhado adolescente, evidente na Nouvelle Vague, mas que se mantem nesse velho de 82 anos.
É como se eu pudesse respirar um pouco. Como se eu e o cinema perdêssemos a vergonha de viver.


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